domingo, 13 de setembro de 2009

Paul Veyne - Do Ventre Materno ao Testamento I

Essa cena, que mostra uma família romana, está em Florença, exposta na Galeria Uffizi. A escolhemos para analisarmos o assunto de hoje: a vida romana.

Um romano tinha uma vida muito diferente do cidadão de hoje, em muitos aspectos. Talvez, o primeiro deles é o que se refere ao nascimento, pois um romano só era considerado "nascido" se fosse pego do chão. Paul Veyne afirma que um cidadão romano não "tinha" um filho e sim o "tomava" ou "levantava" (tollere). Quando a criança nascia, a parteira a colocava no chão. Ela só seria considerada "nascida" se o pai a pegasse dali. Isso acontecia porque, em muitos casos, ele poderia recusar essa criança: famílias pobres não tinham como sustentar, famílias ricas não queriam mudar o testamento e modificar alguma sucessão ou divisão de bens já estabelecida.
Essas crianças poderiam ter diversos destinos: ser abandonadas na rua, ser criadas por outras famílias e até por empregados, em algum lugar longe das vistas do pai.

Após o "nascimento", a criança era criada por criados, geralmente uma nutriz que soubesse grego (língua considerada elegante pelos romanos) e um pedagogo que a ensinasse a escrever. Até mesmo escravos sabiam ler, ao menos as letras maiúsculas, usadas em placas e em grafites nas paredes. Mas as "belas letras" só eram aprendidas pelos mais ricos.

A educação básica era feita pela manhã e durava até os doze anos, em média. Depois disso, os meninos mais ricos continuariam seus estudos, os mais pobres parariam, e as meninas casariam. Entre doze e quatorze anos, uma menina casava e já se tornava "senhora" (domina, kyria). E era o marido, muitas vezes, que continuava dando educação para sua esposa...

Em Roma, haviam muitos filhos e filhas, sendo que a média era três. Mas também haviam muitas adoções. Pais sem filhos para fazerem de sucessor, tanto de herança como na política ou na profissão, podiam adotar alguém para esse papel, e muitos adotavam mesmo tendo filhos. Um dos casos mais conhecidos de adoção foi a de Otávio, por Júlio César. Além de ser seu sucessor político, Otávio acabou se tornando primeiro Imperador Romano.

A família romara era, assim, formada por várias pessoas: pai, mãe, filhos naturais, adotivos, nutriz, pedagogo...Na maioria dos casos, as crianças tinham mais contato com essas pessoas do que com os próprios pais, com quem apenas jantavam. Quando Nero matou sua mãe, teve ajuda de seu nutridor...

E o que uma criança aprendia, na escola? Primeiramente, os romanos valorizavam a firmeza de caráter: ser firme e decidido era uma virtude a ser preservada pelos homens. Indolência, preguiça, falta de vontade, eram "heranças" maternas e/ou femininas. Mesmo que amasse seus filhos, o "senhor" (domine) não podia demonstrar isso, pois firmeza era a palavra. Uma criança era deixada chorando, até aprender que deveria parar.

A educação romana não preparava o indivído para a sociedade, mas para o prestígio: conhecer os pensadores clássicos, falar bem (retórica), cohecer as lendas e mitos, eram formas de se obter destaque, naquela sociedade. Latim para as leis e grego para o enaltecimento do espírito, eram básicos. Já as mulheres poderiam aprender canto, dança e música, mas suas vidas de casadas seriam dentro de casa. Filosofia era matéria para homens e não para mulheres. Nas áres de maior influência grega, também se dava destaque para a ginástica.

Aos quatorze anos, um romano abandonava suas vestes infantis, e já começava sua carreira, seja no serviço público, militar ou político. Quem lhe ensinava suas funções eram seus subordinados, e a ele cabia "aprender" sem deixar transparecer sua ignorância, pois era o "superior".

Na vida pública, o adolescente de seus dezessete anos, passava por uma fase de "indulgência": enquanto da menina se esperava a virgindade, do menino se deixava "experimentar a vida", perdendo a virgindade em bairros onde mulheres se vendiam por dinheiro. Em alguns casos, eles até conheciam mulheres de "classe mais alta", ou até praticavam estupros coletivos, invadindo as casas de mulheres mais pobres. Esses abusos por parte dos jovens, eram "oficializados" pela existência das "associações de jovens" (collegia juvenum). Nelas, jovens se reuniam para praticar esportes, lutas e também desordens, como muitos jovens fazem hoje em dia...

Essa "libertinagem" acabava depois do casamento: nada de grupos de jovens mais, nada de estupros, nada de saques e nem de agressões. O esposo deveria cuidar da sua ida e da sua casa.

Por outro lado, a partir do Século II, começou a se difundir uma idéia, entre os médicos e filósofos, que pregava que os jovens que começavam cedo a conhecer o sexo e os prazeres, se tornavam fracos, moralmente falando. Por isso, era necessário que se mantivesse "puro" o maior tempo possível, sem se envolver em situações degradantes, para que o espírito se fortalecesse. Seria uma preparação para o Cristianismo, que viria a seguir?

Assim, um romano chegava à maioridade...No próximo texto, veremos como era, da maioridade à morte...

(Síntese das páginas 21 a 37)

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